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Recorte – Matéria sobre o projeto Alfabetização de Jovens e Adultos EJA

Recorte – Matéria sobre o projeto Alfabetização de Jovens e Adultos EJA

Texto de Isadora Camargos

O faxineiro Josemildo Felipe da Silva, de 34 anos, mora na rua da sorveteria, pega o ônibus na esquina de cima, desce no ponto em frente à loja de roupa de dois andares, vira na rua da pastelaria e trabalha na agência bancária que tem uma rampa na porta. Analfabeto, ele teve que aprender outros sinais que não os da escrita para andar pelas ruas da cidade. Ele está matriculado no curso de alfabetização de adultos e estuda no horário de almoço no próprio local do trabalho. “O faxineiro é a pessoa que ninguém dá valor. O jeito é estudar e correr atrás do que eu quero”, diz. Pesquisa divulgada essa semana pelo Instituto Paulo Montenegro revela que 7% dos brasileiros são analfabetos.

A pesquisa foi usada para definir o 5º Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional (Inaf). Os números revelam ainda que 30% dos brasileiros têm nível rudimentar de leitura, 38% têm o nível básico e 26% tê, conhecimento satisfatório. A pesquisa foi realizada entre os dias 30 de junho e 10 de julho deste ano.
O Inaf considera analfabetos aqueles que não conseguem realizar tarefas muito simples que envolvam decodificação de palavras e frases. Neste grupo, de 7% da população brasileira, 64% são homens, 77% têm mais de 35 anos e 81% pertencem às classes D e E. Muitos conseguem verificar data de vencimento de produtos (38%) e 86% nunca vão ao cinema, assim como Josemildo.

O dia do analfabeto que mora no bairro Nacional, em Contagem, Região Metropolitana de Belo Horizonte, começa cedo, como qualquer trabalhador que tem que sair da periferia e ir para o Centro. Ele sabe reconhecer o número do ônibus e decorou o desenho da palavra NACIONAL nos letreiros dos ônibus, o que ajuda a acertar a condução. Para pagar a passagem, usa o vale-transporte. O caminho foi decorado pela referência de prédios e lojas. Todas as informações visuais são armazenadas na memória, o que nem sempre dá certo. “Às vezes a memória falha e eu fico perdido”, reclama.

Na esquina do trabalho há uma pastelaria. No interior da loja, são vários os cartazes com preços e promoções e nenhum deles é informativo para Josemildo. Tudo ele tem que perguntar. O que é, quanto custa, de quanto é o troco. Ele conhece as notas, mas não sabe fazer contas e depende da honestidade do vendedor. A dificuldade é grande também quando tem que encontrar um endereço novo. Não adianta dizer o nome da rua porque as placas não são informativas para ele. É preciso dar referências físicas, como a sorveteria que fica perto de sua casa.

No crachá que o identifica como funcionário da empresa está escrito “Josemiltom” e ele diz que “é preciso tirar esse traço daqui”, referindo ao “t” que sobra em seu nome errado. A faxina na agência da Caixa, onde trabalha, também precisa de orientação constante. Reconhecer os produtos químicos sem ler os rótulos nem sempre é fácil, e Josemildo pergunta, como sempre. As compras de supermercado ficam extremamente limitadas. Ele não sabe o que está na prateleira, a não ser algumas marcas que aprendeu a reconhecer. E quando conhece o produto, não sabe qual é o preço. Quando sabe o preço, não sabe se é caro ou barato. Para as compras a prestação, ele estabeleceu que as parcelas não podem ser superiores a R$ 50, mas diz que nem sempre consegue controlar.

No horário do almoço, tem aula com os colegas de trabalho. São 24 adultos que trabalham nos serviços gerais, cada um com uma história de desencontro com o lápis, o caderno e as letras. A professora é bolsista do Programa Brasil Alfabetizado. No início desse ano, a organização não governamental Moradia e Cidadania, formada pelos funcionários da Caixa, fez um diagnóstico e descobriu que os funcionários precisavam de aulas de alfabetização. Procuraram a prefeitura, fizeram uma parceria e os alunos foram atendidos pelo Brasil Alfabetizado. A experiência foi positiva e agora eles têm aula do EJA com uma professora da rede municipal. As aulas acontecem diariamente no horário de almoço. Os funcionários abriram mão de parte do horário livre e os chefes concordaram em liberá-los mais cedo.

“O faxineiro é a pessoa que ninguém dá valor. O jeito é estudar e correr atrás do eu quero”
Josemildo Felipe da Silva, faxineiro

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